Recomeços
– Essa cidade é demais! A gente vai se dar muito bem aqui. – percebendo o irmão em silêncio, ela provocou – Tá com essa cara porque?
– Só estou pensando na vida que deixei no Paraná e em como vai ser para começar em uma turma nova no último ano da faculdade. Fora o tanto que vou ter que ralar para fazer a adequação da grade.
– Affe, Heitor! Para de se preocupar com isso agora. Você entra na sala, escolhe um lugar para sentar, presta atenção na aula e em menos de duas semanas você se enturma. Só isso! Depois você vê os calendários das aulas que você precisa participar e pronto.
– Parece fácil na teoria, mas na prática é bem diferente. Como eu vou colar grau com pessoas que eu mal conheço? E a festa de formatura?
– Relaxa e pensa no lado positivo, você pode participar da sua festa de formatura de lá e da festa daqui. E ainda trazer amigos de lá para a sua festa daqui.
O irmão sentou na cama, ela se aproximou por trás dele, o abraçou e disse:
– Maninho, eu te ajudo. Eu sei que deve ser muito difícil para você deixar todos seus amigos e eu também fiquei triste de deixar minhas amigas. Mas ainda bem que a gente pode contar um com o outro e também com o papai e com a mamãe.
Ela deu um beijo na nuca dele e ele disse:
– Obrigado, Marina. Não vai ser fácil, mas a gente se protege e se ajuda.
Neste momento, Nelson entrou no quarto e anunciou:
– Vamos todos comer pizza! Um colega aqui de São Paulo indicou uma pizzaria ótima e vamos sair em 30 minutos.
– Eu já estou pronta! Só o Heitor que está de bode… – disse Marina indo em direção ao pai e o abraçando.
– Meu filho, vai dar tudo certo. – Nelson se soltou de Marina, foi em direção ao filho e o abraçou – Não foi fácil tomar essa decisão. Eu e sua mãe pensamos muito e só decidimos vir por acreditarmos que vocês terão mais oportunidades de educação, se tornarão profissionais melhores e mais qualificados. Eu quase recusei e pedi demissão para assumir a loja da sua mãe, pensar em um plano de expansão, mas seria muito arriscado.
– Eu sei que você e a mamãe fizeram o melhor pela gente, pai. Isso é coisa minha e com o tempo vai passar. Eu sei que fiquei chateado e um pouco bravo quando o senhor falou que a gente viria para cá, mas depois pensei melhor e sei que foi um sacrifício necessário.
– Heitor, eu compreendo que você tinha uma namorada, amigos e um estágio, mas aqui tem tudo isso também. Daqui a pouco você se enturma, conhece uma garota nova… E assim que você se acertar com a faculdade, eu consigo um emprego para você. Mas, não se preocupe com isso. Eu vou continuar te ajudando, aliás, nós vamos continuar te ajudando em tudo que for necessário.
Ele olhou para o pai, deu um beijo em seu rosto e agradeceu.
– Agora, chega de drama e vamos comer pois estou com fome! – disse Marina.
A família saiu para comer e voltou por volta das onze da noite. Nelson e Rosana foram direto para o quarto e os irmãos ficaram na sala, olhando a cidade pela nova varanda.
– Cara, eu nunca comi tanto e tão bem! – disse Marina.
– Foi a melhor pizza que eu já comi na vida.
– Eu li tudo sobre esse bairro. Aqui é muito legal, tem muita influência italiana, é perto de tudo, tem fácil acesso para a Liberdade, aquele bairro dos japoneses, tem a 25 de Março… Vai ser demais! – disse Marina bastante empolgada.
– Amanhã você me conta! Agora vou fazer igual o papai e a mamãe, vou para o quarto e vou dormir.
– Aproveita para descansar bastante pois amanhã a gente tem uma folguinha, mas depois chega a nossa mudança e vamos ter que ajudar a mamãe arrumar tudo. Eu vou ficar olhando a cidade mais um pouco aqui de cima.
Heitor deu um abraço e um beijo na irmã, foi para o quarto e, cansado que estava, tirou a roupa, jogou em um canto, vestiu a primeira samba canção que encontrou na mala e deitou. Antes de dormir, entretanto, Heitor pegou o celular e viu, entre outras, algumas mensagens de Natalie e Flávio.
Enquanto ela desejava boa sorte “na nova vida em São Paulo” seguida de um emoji de beijo, ele, por sua vez, perguntou se Heitor já tinha chegado em São Paulo e dizia que ainda guardava na memória a lembrança da última noite que tiveram juntos, encerrando a mensagem com a frase provocativa “Quando você voltar, eu vou continuar aqui”, seguida de dois emojis: o do capetinha sorridente seguido de uma berinjela. Ele deixou as duas mensagens sem resposta, desligou o telefone e ficou com os olhos fechados até o sono chegar.
No dia seguinte, Marina acordou cedo e foi até o quarto do irmão para acordá-lo. Enquanto abria a janela, ela disse:
– Acorda, Heitor! Vamos levantar, maninho! É nosso primeiro dia em São Paulo, quero tomar café, sair para conhecer a cidade e você vai junto. Quando nossas aulas começarem, nossa vida vai virar uma loucura e não teremos tempo para mais nada. E você menos ainda… Eu estou no segundo ano e só tenho duas matérias extras para fazer. E você que tem 7?
Heitor, com cara e voz de sono, coçou os olhos e disse:
– Daqui a pouco eu vou.
– Daqui a pouco nada! Mamãe já fez o café e só falta você. Vamos! Coloca uma camiseta e já para a sala. Papai odeia que você coma só de samba canção. Vamos! Só saio dessa casa com você!
Heitor pegou a camiseta que tinha usado no dia anterior, foi até o banheiro, lavou o rosto, voltou para o quarto e encontrou a irmã o esperando:
– Muito bem! Hoje a sua cara está melhor. Parece que finalmente você começou a superar a separação entre você e o Flávio.
Heitor sentiu a barriga gelar, olhou para a irmã e disse:
– Como assim? O que você está querendo dizer?

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